quinta-feira, 12 de março de 2009

O segredo erótico

Na introdução ao livro Intimidades composto por dez contos eróticos de escritoras brasileiras e portuguesas, Luísa Coelho reflecte sobre a relação erotismo, pornografia e literatura. Refere a variação dos conceitos no decorrer da história e “considera pornográfico, o discurso em que a descrição das partes do corpo, do acto sexual, bem como o intuito explícito de excitar um terceiro, é o objectivo maior da narrativa, esvaziando a sexualidade e os seus mistérios. Seria pornográfica, na sua opinião, a representação de uma pulsão primária subjectiva, imbuída de uma violência sobre outra pessoa, campo de exercício de poder. É a sexualidade expurgada do erotismo que, por sua vez, mistura instinto e fantasia, interdito e prazer. Já aí fica subentendido o universo mais amplo e enigmático do erotismo.
Transpondo estes conceitos para o cinema, eu diria que “Deep Throat” é pornografia, “In the mood for love”, é erotismo. A palavra erotismo deriva de “Eros”, a manifestação de tudo o que é “belo”.Em termos gerais, erotismo é uma forma artística de expor a sexualidade, em que os detalhes contam mais do que o objectivo. Permite-nos fantasiar e observar para além do óbvio e do expectável.
A pornografia está normalmente associada a uma forma obscena de exposição sexual, sem qualquer critério artístico e com conteúdos sexuais explícitos. Em termos cinematográficos ou mesmo literários é muito frustrante antecipar todas as cenas que se seguem ... é uma espécie de ritual ou linha de montagem. Mas como tinha dúvidas em relação à linha divisória entre uma coisa e outra, fui dar uma espreitadela à Wikipédia que classifica pornografia como “uma modalidade politico-filosófica do conhecimento (lolol). Situa-se entre a sacanagem e o erotismo na Teoria Epistemológica e envolve conexões com habilidades manuais, morfo anatómicas, sinestesia e visuo voyeurísticas (as coisas que se aprende na Wikipédia…)
Isto remete-me para outro dilema que é a diferença entre “f…” “fazer sexo” e “fazer amor”. Nesta simples frase, creio estar condensada a explicação: “quanto mais variado for o sexo que se pratica com amor ao dito, melhor é a f…”
Mas voltando àquilo que considero o expoente máximo do erotismo cinematográfico … passou na RTP2 “In the mood for love”” do realizador Kar-Wai Wong. A história passa-se nos anos 60, numa sociedade oriental altamente castradora e conservadora. É um filme altamente sensual e perturbador, até ao fim. Primeiro há a troca de olhares, a conversa inocente, os passeios lado a lado sem nunca se tocarem. O único contacto entre os amantes e simultaneamente o momento mais excitante do filme foi quando a mão dele encontrou a dela e apertou-a fortemente. Todo o enredo gira à volta duma relação possível e impossível simultaneamente. Não se passou nada e, no entanto, aconteceu tudo.