A auto-estima dos portugueses é como o pelo de um gato: se lhe passam a mão num sentido, toda ela se compraz no afago. Se lha passam em sentido contrário, toda ela se arrepela. Dificilmente encontramos um meio-termo, porque a imagem que os outros fazem de nós é-nos essencial. Razões? Entre outras, o facto de sermos talvez o país mais periférico da Europa, o mais distante e isolado do coração do continente, onde tudo – a História - se passou e passa. Isto, se nos poupou a algumas das maiores violências dessa História, tornou-nos também num povo esquecido, e que se ressente disso a nível do inconsciente colectivo.
O nosso peso nos acontecimentos europeus sempre foi reduzido ou nulo – tirando as consequências da expansão marítima, imensas mas bem caracterizadas e localizados no tempo. As nossas contribuições no campo das ciências, da filosofia, das artes não vão além (quando vão) de notas de rodapé na história do espírito humano. Em alguns casos, nem sequer por demérito próprio, mas porque o afastamento do centro europeu não permitiu o reconhecimento (quero com isto dizer que temos um ou outro pintor, um ou outro músico, um ou outro sábio, e alguns escritores e poetas que talvez pudessem figurar com outro relevo nos compêndios se fossem italianos, flamengos, alemães, franceses ou mesmo espanhóis).
É contra este “esquecimento”, quase visto como uma fatalidade que a consciência portuguesa, melhor seria dizer, o inconsciente português – reage, por vezes de forma tão sensível e até provinciana. Falam tão pouco de nós, que quando falam, mesmo que seja para dizer mal, prestamos toda a atenção. Por isso vivemos tão intensamente os êxitos e os fracassos futebolísticos – porque eles são uma rara oportunidade de entrarmos em confronto directo com o estrangeiro sob o olhar de uma plateia internacional.
Hoje o tema de discussão centrou-se no lote de convocados para o Mundial 2010 e a partida de férias antecipada de Quim e João Moutinho. A visita de Sua Santidade (nome artístico, Bento XVI), também teve a relevância devida, pois além de dinamizar a nossa moribunda economia, tem subjacente a mensagem de paz, união e benzeduras, como forma de branquear acontecimentos que pouco ou nada têm a ver com os fundamentos cristãos.
O aumento do IVA e o assalto ao 13º mês, deverão ser encarados como dádivas celestiais que vão permitir que Portugal, a curto prazo, faça um exorcismo colectivo (mas só à conta dos papalvos do costume), que lhe permita erguer-se momentaneamente para imediatamente cair no fosso onde agoniza uma Europa moribunda, velha e retrógrada.
Acabou a pimenta da Índia, depois o ouro do Brasil, depois as coisas de África e os povos que roubamos outrora, chamam-se agora emergentes.
Resta-nos o Fado e, já agora, a resignação …
3 comentários:
E resta-nos uma coisa muito mais importante, resta-nos a nossa sabujice, a imensa capacidade das nossas elites de baixarem as calças sempre que aparece um estrangeiro pela frente...
Não podia estar mais de acordo!!!Gostei não só da escrita (fluente, acessível e correcta) mas tb do conteúdo!! Excelente lucidez e humildade! Fiquei com vontade de voltar! Parabéns!
És sempre bem vinda!
E parabéns, pela forma cuidada e rigorosa como tratas o teu jardim.
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